Perfis de Genotipagem: por que precisamos deles?

Atualmente muito se fala que a Genética não é destino, não é determinante. Sem dúvida parte disso é verdade. Entretanto, requer um certo cuidado, pois nascemos sim, com suscetibilidades diferentes a certas doenças, não predeterminação. Portanto, a genética, de certa maneira, determina o seu estilo de vida. Por exemplo, se você nasce com genótipos que levam a maior risco de doenças cardiovasculares, você terá que escolher hábitos que minimizem esse risco. Portadores de alelos de risco que levem a um processo inflamatório mais intenso e consequente maior risco de doenças cardiovasculares precisam se expor menos, melhor não se expor, a diversos produtos químicos presente na dieta industrializada. Dessa maneira, a suscetibilidade tem chance muito menor de levar a uma doença cardiovascular. Devido a isso, destaca-se a importância de perfis genéticos que avaliem essa suscetibilidade, para que você e o profissional de saúde possam estabelecer estratégias personalizadas.

Entretanto, por mais importante que o gene seja, não é o DNA que executa a função fisiológica, quem executa é a proteína, a enzima, o ncRNA, etc. Segundo o ENCODE, os seres humanos possuem aproximadamente 23.000 genes (incluindo genes que codificam ncRNA). Porém, até o momento, já foram descritas mais de 1 milhão de proteínas e enzimas. Assim, cada gene potencialmente pode codificar várias proteínas e enzimas diferentes em diferentes tecidos. Portanto, é necessário um excelente mecanismo de regulação da expressão gênica, o qual determinará qual produto gênico e qual a quantidade deste será produzida em resposta a um fator ambiental em um momento específico e em um tecido específico. A regulação da expressão gênica está fortemente associada a alterações químicas, como metilação, ribosilação, fosforilação, ubiquitinação etc, no DNA ou na cromatina, as quais permitem ou inibem a expressão gênica e chamamos de epigenética (Fell e Fraga, 2012). Discutiremos melhor epigenética em outra oportunidade. O importante agora é saber que essas alterações químicas podem ser constantemente modificadas pelos fatores ambientais, incluindo o tratamento terapêutico, atividade física  e, principalmente, a dieta (Mutch e Clément, 2006).

Portanto, você médico ou nutricionista constantemente utiliza ferramentas de epigenética para tratar o seu paciente, mas isso não quer dizer que a epigenética é mais importante. Embora alguns digam que transcende a genética. Belo discurso, mas fora da realidade. Genética e epigenética fazem parte do mesmo processo, são classificados didaticamente como fatores diferentes apenas para que nós, com as nossas limitações, possamos entender melhor. O fato é que hoje ainda não é exequível a edição do DNA como proposta terapêutica, há muito o que evoluir ainda, mas podemos e devemos conhecer os fatores  genéticos e epigenéticos para modular a expressão dos genes de acordo com objetivos específicos, visando prevenção ou tratamento personalizado.

Essa é a grande vantagem, a grande importância da epigenética. Entretanto, não devemos esquecer, que o mesmo tratamento terapêutico, a mesma dieta, o mesmo tipo de atividade física, pode levar a respostas heterogêneas.

Mas por que isso acontece?

As variantes genéticas levam a diferentes necessidades de componentes da dieta e de medicamentos, implicando na necessidade de abordagens personalizadas. Há uma grande heterogeneidade, por exemplo, na resposta frente a mesma dieta que está relacionada a fatores como microbiota e muitas outras causas epigenéticas e genéticas. Existem muitos genes associados a obesidade, cada um contribuindo um pouco para o ganho de peso (de 2 a 3 kg, por exemplo); (Locke et al., 2015),   acúmulo de gordura; aumento da circunferência da cintura; percentual de massa magra, etc. Portanto, é vital a utilização de um amplo perfil de genotipagem em obesidade, que ajuda a explicar porque um paciente emagrece 8 kg com uma dieta hipocalórica enquanto o outro não; se o paciente responderá melhor ou não a dieta low carb, mediterrânea ou balanceada; ajuda a definir o percentual de gordura, carboidratos e proteínas que otimizam a perda de peso; o percentual de gordura monoinsaturada e ômega 3, que podem acelerar o emagrecimento; se o uso de melatonina ou fitoterápicos pode melhorar a sensação de saciedade e levar ao consumo adequado de alimentos; se há tendência a consumir doces, compulsão alimentar ou mania de beliscar entre as refeições; se atividade física levará a boa perda de peso ou até mesmo se atividade física intervalada é a mais indicada para tal, etc.

Diversos estudos têm demonstrado que os perfis de genotipagem podem ser muito úteis para predição de risco e assim, permitir um melhor acompanhamento e minimizar a suscetibilidade genética (Mitchell e Streeten,, 2013), como ocorre, por exemplo, com o câncer de mama: alguns estudos relatam que mulheres que consomem uma menor quantidade de verduras, frutas e legumes; e que também são portadoras de um alelo (variante genética) que leva a menor eficiência enzimática da SOD2, apresentam maior risco de desenvolvimento de câncer de mama. Isso ocorre por que esse alelo de risco compromete a capacidade antioxidante endógena que, associada a menor ingestão de antioxidantes provenientes das verduras, frutas e legumes, leva a menor capacidade de defesa contra antioxidantes, o que pode levar a danos no DNA, o que, consequentemente, aumenta o risco de mutações que podem favorecer o desenvolvimento de diversos tipos de câncer, inclusive o de mama.

E o que pode ser feito para prevenir? 

Aumentar a ingestão de quercetina e curcumina, por exemplo, que levam a maior expressão do gene SOD2, potencialmente produzindo maior quantidade de SOD2, compensando a menor eficiência enzimática e minimizando a suscetibilidade genética.  Pode ser interessante também a maior ingestão de precursores de antioxidantes endógenos, como manganês, zinco, cobre e selênio, para otimizar a capacidade antioxidante endógena. Em um segundo momento, caso a produção de radicais livres supere esta capacidade, torna-se necessário a utilização de antioxidantes exógenos como vitamina C, E, polifenóis, flavonóides, carotenóides, etc, presentes nas verduras, frutas e legumes ou em suplementação. Se o indivíduo não for portador do alelo de risco, a necessidade de antioxidantes não é tão grande e o consumo desnecessário ainda pode levar ao efeito contrário, induzindo uma ação pró-oxidante, o que hipoteticamente,  pode  aumentar o risco de câncer.

Todos nos já ouvimos falar que o consumo de sal pode levar a maior risco de desenvolvimento de hipertensão e, consequentemente, a um maior risco de doenças cardiovasculares. No entanto, alguns indivíduos são mais sensíveis ainda: portadores do alelo I de um polimorfismo do gene ACE são, por exemplo, mais sensíveis a ingestão de sal refinado, e é aconselhável que limitem o consumo a 2,9 g/dia para minimizar o risco de hipertensão. Sem exageros, o sódio presente no tempero é vital para vários processos biológicos. Processo semelhante ocorre com o café: metabolizadores lentos para o gene CYP1A2, que metaboliza a cafeína, devem limitar o consumo de café a uma xícara por dia; enquanto metabolizadores rápidos podem consumir mais da bebida, só que sem exageros.

A aptidão e resposta frente à atividade física também é heterogênea. Indivíduos portadores do genótipo RR do polimorfismo rs1815739 do gene ACNT3 apresentam maior aptidão para exercícios de força e velocidade, enquanto portadores do genótipo XX apresentam maior aptidão para exercícios de endurance. Indivíduos que possuem maiores níveis de homocisteína têm menor capacidade cardiorrespiratória, que pode ser melhorada otimizando-se o consumo de vitamina B12, B6 e ácido fólico, cujas necessidades são influenciadas por fatores genéticos. Um exemplo disso são os portadores do alelo C do polimorfismo C667T, que podem apresentar maiores níveis de homocisteína, mesmo quando consomem a RDA recomendada e podem necessitar de 0,8 a 1mg/ dia de ácido fólico para diminuir os níveis de homocisteína e assim otimizar a capacidade  cardiorrespiratória.

Portanto, um perfil de genotipagem em Atleticogenômica permite a otimização da performance atlética, além de minimizar o risco de lesões e diminuir o tempo de recuperação do esportista. A aplicação do perfil de genotipagem em Dermatogenética pode permitir a melhor estimativa pessoal das necessidades de ativos orais e tópicos que possivelmente melhoram a saúde da pele e diminuem o risco de formação de rugas ou até mesmo revertem o número delas. Dessa forma, a aplicação de vários perfis de genotipagem possibilita a predição e prevenção de doenças e a otimização de diversos tratamentos em medicina, nutrição e atividade física, por exemplo.

Saiba mais: www.multigene.med.br.

Tel; 14-99178-3299

Referências Bibliográficas.

Fell e Fraga. Epigenetics and the environment: emerging patterns and implications . Nature  Reviews Genetics, v.13, p. 97-109, 2012.

 Locke et al. Genetic studies of body mass index yield new insights for obesity biology. Nature, v, 518, p. 197-220, 2015.

Malik et al.  Global obesity: trends, risk factors and policy implications Nat. Rev. Endocrinol. v.9, 13–27 ,2013.

 Mitchell e  Streeten. Clinical impact of recent genetic discoveries in osteoporosis. The Application of Clinical Genetics, v.6, p. 75–85, 2013.